sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Sobre O Grande Gatsby - de Fitzgerald / p1


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Sobre O Grande Gatsby (The Great Gatsby, 1925)
romance de F. Scott Fitzgerald (1896-1940)
(trad. de Roberto Muggiati)


Testemunhando que depois da euforia vem a depressão


Parte 1

Quando a literatura elege certos momentos da História para captar temas e elencar figuras, é geralmente por fixações e temores do autor, que ao escolher um tema e momento se sente particularmente afetado, demasiadamente incluído . Suas atribulações estão dissolvidas ou concentradas na obra, que soa como um testemunho do vivido/ sofrido. Suas convicções estão em uma ou outra personagem, assim como seu desprezo. Uma época imediatamente anterior aquela em que a obra é reconhecida, pois é preciso toda uma geração adiante para que os olhos se voltem para aquela geração que deixou marcas.

Assim acontece com F. Scott Fitzgerald que viveu e sofreu na euforia da Era do jazz e das finanças na década de 1920, 'os loucos anos 20', na euforia antes da Grande Depressão, quando os jovens e investidores ganham montes de dinheiro e se afogavam no fundo de bebedeiras. Tanto desvario deu um nome a esta geração norte-americana do início do século 20, que vivia entre luxo e embriaguez, tanto na América quanto na Europa (de preferência na França pós-Grande Guerra), assim a 'Geração Perdida' (Lost Generation) que incluía além de Fitzgerald os escritores E. Hemingway, Gertrud Stein, John Dos Passos, Nabokov, dentre outros, absortos em si mesmos e na prosperidade volátil.

O Grande Gatsby testemunha sobre a geração dos anos 1920, no mundo ocidental, assim como Pergunte ao Pó e A Náusea descreve os anos 1930 e On The Road / Pé na Estrada aborda os anos 1960, com suas personagens e situações pitorescas, com ironia e admiração, entre o desejo e a amargura, pois cada obra testemunha o ápice e a queda da geração que abriga o autor. Quem narra está intimamente ligado ao narrado, tem cicatrizes a serem fechadas, tem dramas a serem desbloqueados. Mesmo que o autor não se apresente, deixando na linha de frente um narrador. Nada de visão onisciente de uma narrativa em 3ª pessoa, mas de alguém situado nos fatos narrados, mas que não sabe de tudo, antes descobre à medida em que se dedica a narrar.


Em O Grande Gatsby, por algum motivo, o narrador se manifesta, lembra que temos em mãos um livro, sobre um exótico protagonista, que merece nossa volátil atenção. Nada sabemos além do que Nick nos relata, nem porque ele se impressionara tanto a ponto de narrar. É ao longo da narrativas, com suas tessituras e entrelinhas, que descobrimos, pouco a pouco.

Apenas Gatsby, o homem que dá seu nome a este livro, estava isento da minha reação – Gatsby que representava tudo aquilo por que sinto um desprezo sincero. Se a personalidade é uma série ininterrupta de gestos bem-sucedidos, então havia algo magnífico nele, uma sensibilidade exacerbada diante das promessas da vida, como se estivesse ligado a uma daquelas máquinas intricadas que registram terremotos a quinze mil quilômetros de distância.” (p. 6)


Sabemos mais sobre o narrador, que lutou com as tropas norte-americanas na Primeira Guerra Mundial (aqui denominada ironicamente “aquela migração teutônica protelada”) em 1917 – o mesmo tendo acontecido com o jovem Larry Darrell de The Razor's Edge, 1944, de Somerset Maugham, segundo comentado no ensaio sobre O Lobo da Estepe, de H. Hesse.


Links para o Meu Cânone Ocidental

sobre a Geração Perdida e a Era do jazz


O narrador, um novato no mundo dos negócios e da especulação, é quem nos conduz ao mundo excêntrico de Gatsby, o Grande, que é o oposto do seu próprio, uma vez que o jovem Nick Carraway é um sujeito mais reservado e leitor de bons livros, em suma, alguém que não vive a aventura, mas está apto a escrevê-la. Até porque ele é um ótimo observador, cuja erudição entrega densidade às descrições de personagens e situações (o que seria diferente caso o narrador fosse o protagonista Gatsby...),

Eu era um tanto chegado à literatura na universidade – um ano escrevi uma série de editoriais muito solenes e óbvios para o Yale News – e agora ia trazer de volta todas as aquelas coisas para minha vida e me tornar de novo aquele mais limitado dos especialistas, o homem 'cultivado'. Isto não é apenas um epigrama – afinal, pode-se ver bem melhor a vida observando-a através de uma única janela.” (pp. 8-9)


Descrições de ambientes e pessoas são marcantes em detalhes e observações irônicas. É o narrador, juntamente com o que é narrado, que cria a estética magistral de The Great Gatsby. O narrador está fora e também dentro, sendo parente (primo) de uma das protagonistas, da encantadora Daisy, casada com o ricaço, herdeiro de várias gerações, Tom Buchanan, daí ser agora a Sra. Buchanan. O que faz Daisy ser especial é o fato de ser uma antiga paixão do agora milionário excêntrico, promotor de festanças, o Sr. Gatsby, o novo rico que mora do outro lado da baía.

A descrição do casal Buchanan é repleta de ironias e humor ácido, pois eles são familiares e ao mesmo tempo contrários. Eles levam a vida luxuosa que Nick não pode ter, ou não pretende ter, o que permite que ele tenha julgamento para observá-los e melhor julgar. Uma vida de ricaços, luxuriosa e ao mesmo tempo vazia e inútil, entre encontros sociais, esportes e festanças. Como uma nobreza apartada do povo, em época de pós-guerra, antes da Grande Depressão econômica (1929-1933). Estando o narrador fora e dentro, ele avalia o jovem casal, e se interessa pela visitante, a bela e fatal Srta. Baker. Ele faz uma visita social que logo se torna de interesse amoroso, de reafirmação amorosa. O interesse pela Srta. Baker é imediato, “Gostei de observá-la. Era uma garota esguia de seios pequenos com um porte ereto que acentuava jogando os ombros para trás como um jovem cadete. Seus olhos cinzentos, contraídos pelo sol retribuíram-me o olhar com uma curiosidade recíproca e educada num rosto pálido, encantador e insatisfeito. Ocorreu-me agora que eu já a tinha visto, ou a um retrato dela, em algum lugar.” (pp. 15-16)


Quanto a Tom Buchanan, o esportista de família rica, é um tipo conservador, um racista quase um nazi-fascista, ao abordar temas como raça dominante branca e nórdica, em

'A civilização está caindo aos pedaços', interrompeu Tom violentamente. 'Acabei me tornando um pessimista terrível em relação às coisas. Vocês leram A ascensão dos impérios de cor, escrita por este sujeito, Goddard?

'Não', respondi um tanto surpreso com o seu modo.

'Bem, é um livro excelente que todo mundo devia ler. A ideia é que, se não prestarmos atenção, a raça branca será... ficará totalmente sumersa. É tudo coisa científica; foi tudo provado.' (pp. 17-18)



mais sobre Gatsby e a decadência em


Sua bela esposa Daisy é cínica, assim mesmo ela se define ao primo Nick, que anda boquiaberto com tanto luxo e vazio,

'É verdade.' Ela hesitou. 'Bem, passei por uma fase muito difícil, Nick, e fiquei um tanto cínica em relação a tudo.'

Era evidente que tinha motivo para ser cínica. Esperei, mas ela não falou mais nada e, depois de um momento, voltou sem muita convicção ao assunto de sua filha.” (p. 22)


Logo em seguida Nick descobre que Tom vive a trair sua prima Daisy com uma mulher casada, esposa de um mecânico da autoestrada. E não hesita em apresentar a amante ao narrador! “'Vamos descer!', insistiu. 'Quero que conheça minha garota.' Acho que ele tinha bebido bastante no almoço e sua determinação em contar com a minha companhia beirava a violência. A suposição soberba era de que numa tarde de domingo eu não devia ter nada melhor a fazer.” (p. 28)

Nas conversas entre o casal e a Srta Baker é mencionada uma das festas de Gatsby, sempre grandiosas, “Estive lá numa festa há cerca de um mês. Na casa de um homem chamado Gatsby. Você o conhece?” (p. 37) Festas que Gatsby oferece a uma multidão de gente que ele sequer conhece, e que nem se importa em conhecê-lo. Afinal, é apenas um novo rico. Mais sobre as festas de Gatsby circula em outra festa, quando Nick se embriaga, ou se vê obrigado a se embriagar, no apartamento da amante de Tom, em companhia de gente que definitivamente não é da classe do ricaço. Nick presencia o desregramento e o delírio num apartamento, onde ele está dentro e fora, bêbado e sóbrio para perceber-se bêbado, e pronto para presenciar um ápice do nonsense: a violência contra a mulher: Tom agride a amante, quando esta ofende a esposa Daisy. “Num movimento breve e preciso, Tom Buchanan quebrou o nariz dela com um tapa.” p. 42

Mais é no capítulo 3 que saberemos mais sobre as festanças do Sr. Gatsby, descritas em detalhes, entre o realismo e o surrealismo pelo narrador Nick, um dos (realmente) convidados. Aliás, parece ser ele o único convidado. O resto dos loucos, artistas, playboys, mulheres da vida, empresários, jogadores, dançarinas, ricos e novos ricos, aparecem em carros em alta velocidade vindos de toda parte da metrópole.

Eu ouvia música da casa do meu vizinho durante as noites de verão. Em seus jardins azuis homens e garotas iam e vinham como mariposas entre os sussurros e o champanhe e as estrelas. Na maré alta da tarde eu observava seus convidados mergulhando da torre da sua balsa ou tomando sol na areia quente de sua praia enquanto suas duas lanchas a motor cortavam as águas do Estreito, puxando aquaplanos sobre cataratas de espuma.” (p. 45)


O bar está no auge da animação e rodadas flutuantes de coquetéis permeiam os jardins até que o ar fica cheio de conversas e risos, insinuações casuais e apresentações esquecidas em um instante, e encontros entusiasmados entre mulheres que jamais ouviram o nome uma da outra.

As luzes ganham brilho à medida que a terra se afasta do sol e agora a orquestra toca música de coquetel melancólica e a ópera de vozes atinge um tom mais agudo. Os risos se tornam mais fáceis a cada minuto, derramados com prodigalidade, provocados por uma palavra jocosa. Os grupos mudam mais rapidamente, são engrossados por novas chegadas, dissolvem-se e formam-se num mesmo instante – já existem garotas nômades e confiantes que circulavam aqui e ali entre as mais robustas e mais estáveis e então, excitadas por seu triunfo, deslizam através da maré de rostos, vozes e cores debaixo da luz em contínuo câmbio. “ (pp. 46-47)


É assim que é desperdiçado o dinheiro fácil em épocas anteriores à Depressão (causada justamente pela especulação...), o que vem a atrair o jovem Nick para a metrópole, onde pretende se encaixar no circo da grana-fácil, e lucrar como muitos julgam lucrar. “Eu tinha certeza de que estavam todos vendendo alguma coisa: títulos, seguros ou automóveis. Tinham, pelo menos, uma noção muito precisa do dinheiro fácil que existia naquela vizinhança e estavam convencidos de que aquele dinheiro seria seu mediante umas poucas palavras na tecla certa.” (p. 48)

Circulavam boatos sobre a figura de Gatsby. O que ele seria? Um assassino? Um espião? De onde vem toda a sua riqueza? Por que tanta generosidade? Aliás, onde estava o anfitrião Gatsby? Ninguém conhece Gatsby, ninguém foi convidado por Gatsby. “Todos nos viramos e olhamos ao redor em busca de Gatsby. Uma prova da especulação romântica que inspirava é que havia cochichos sobre ele até da parte de pessoas que jamais sentiram necessidade de cochichar sobre nada neste mundo.” (p. 50)

Enquanto não encontra o anfitrião-protagonista, o narrador Nick perambula pela mansão em festa e delírio, a encontrar exóticos 'convidados'. Jovens sem rumos, damas bêbadas, um excêntrico 'leitor' na ampla biblioteca, todos impressionados com a riqueza e o esbanjamento, com a festa e a figura (anônima) do anfitrião. É de verdade a decoração e os pratos requintados. É de verdade os grossos volumes na biblioteca. O sujeito esbanja riqueza e bom gosto, se dedica à leitura! (Ou aparenta se dedicar à leitura...)

Mas é apenas quase ao fim da festa que o narrador se vê diante do anfitrião, ali meio aos 'convidados', flanando entre as mesas, a observar os risos e sorrisos, a contemplar o efeito de sua generosidade festiva. De súbito, um dos homens inicia uma conversa com o narrador, sobre fatos da guerra anterior, a Primeira Guerra Mundial, uma vez que ambos dela participaram. Mas quem é o homem que sobreviveu à guerra? Ele se apresenta, é Gatsby!

Sorriu com um ar de compreensão – muito mais do que compreensão. Era um daqueles sorrisos raros com uma qualidade de eterna reafirmação, que a gente encontra umas quatro ou cinco vezes na vida. Ele se defrontava – ou parecia se defrontar – com todo o mundo externo por um instante e então se concentrava em você com uma parcialidade irresistível a seu favor. Ele o entendia na medida em que você desejava ser entendido, acreditava em você como você desejaria acreditar em si mesmo e lhe garantia que guardava de você a impressão que, à melhor maneira, você esperava transmitir. Precisamente naquele ponto ele se evaporava – e eu estava procurando um elegante jovem casca grossa, um ano ou dois além dos trinta, cuja elaborada formalidade de fala beirava o absurdo. Algum tempo antes de se apresentar, teve uma forte impressão de que escolhia suas palavras com cuidado.” (pp. 54-55)


O que temos, afinal, é uma descrição de Gatsby segundo as impressões de Nick, ali bem impressionado, meio sem rumos, dentro e fora da festança,

[...] meus olhos caíram sobre Gatsby, sozinho no pé nos degraus de mármore, olhando de um grupo para outro com um ar de aprovação. Sua pele bronzeada era atraentemente lisa no rosto e os cabelos curtos pareciam ser aparados todo dia. Eu nada conseguia ver de sinistro nele. Imaginei se o fato de não estar bebendo ajudava a distanciá-lo dos convidados, pois me parecia que ele se tornava mais correto à medida que a hilaridade fraternal aumentava.” (pp. 56-57)

Depois o narrador tece considerações sobre a própria narrativa, relendo suas impressões após as noites de festa, “Relendo o que escrevi até agora, vejo que dei a impressão de que os acontecimentos de três noites, separadas entre si por várias semanas, foi tudo o que me absorveu. Ao contrário, foram acontecimentos meramente ocasionais num verão tumultuado e, a não ser muito depois, me absorveram infinitamente menos do que meus afazeres pessoais.” (p. 63)

Quais afazeres pessoais? De fato, é agora que ficamos sabendo mais sobre o seu trabalho, no ramo de finanças (em corretora de títulos) em Manhattan, Nova York.

A maior parte do tempo eu trabalhava. De manhã cedo o sol projetava minha sombra para oeste enquanto eu seguia apressado pelas ravinas brancas da parte baixa de Nova York em direção da Firma. Conhecia os outros funcionários e jovens corretores de títulos pelo primeiro nome, almoçava com eles em restaurantes escuros e lotados […] Eu jantava geralmente no Yale Club – por algum motivo era o acontecimento mais sombrio do meu dia – e então subia à biblioteca e estudava investimentos e títulos durante uma hora conscienciosa. Havia quase sempre alguns bagunceiros por lá, mas nunca vinham à biblioteca, por isso era um bom lugar para se estudar. Depois, se a noite era branda, eu seguia a pé pela Madison Avenue, passando pelo velho Murray Hill Hotel e atravessando a rua 33 até a Estação Pensilvânia.” (pp. 63-64)


Nosso narrador, Nick Carraway, perambula pela noite nova-iorquina no começo dos anos 1920, a sentir-se solitário meio às multidões, e aos olhares, e às luzes néons, e aos turbilhões de carros e promessas de prazeres, assim cerca de uns trinta anos do jovem Holden Caulfield de Catcher in the rye, de J.D. Salinger [1919-2010], que narra uma caminhada pela Big Apple, congelada na época do Natal, a carregar “The Great Gatsby” como uma de suas leituras de referência.

Link para o ensaio em Meu Cânone Ocidental



Nick, o solitário, vê-se interessado na jovem esportista Jordan Baker, que ele conhecera n casa de Daisy e Tom. Como ele vê a Srta. Baker, que tanto o atrai?

Jordan Baker evitava instintivamente homens perspicazes e agora eu via que isto acontecia porque ela se sentia mais segura num plano em que qualquer divergência de um código seria julgada impossível. Ela era uma desonesta sem cura. Não era capaz de suportar uma posição de desvantagem e, considerando esta resistência, imagino que ela começara a lidar com subterfúgios ainda bem jovem a fim de manter aquele sorriso insolente voltado para o mundo e, ainda assim, satisfazer as demandas do seu corpo vigoroso e elegante.” (p. 65)

Ao contrário de Jordan, Nick se considera uma pessoa honesta, como declara no último parágrafo do capítulo 3. Será que opostos se atraem? “Todo mundo suspeita de si mesmo que possui pelo menos uma das virtudes cardeais e esta é a minha: sou uma das poucas pessoas honestas que já cheguei a conhecer.” (p. 66)


A relação do narrador com o protagonista da narrativa é a mesma de admiração e distanciamento que encontramos em obras como “The Razor's Edge”, onde o autor-narrador Maugham focaliza a vida de Larry Darell, ou ainda “Doktor Faustus”, de Thomas Mann, onde Serenus Zeitbloom observa as vicissitudes de Adrian Leverkühn. São naradores que estão dentro da narrativa, mas numa zona limítrofe com o fora. Eles sabem que servem apenas para narrar a estória, não interferir na mesma. Sabem que o protagonista deve ser o foco de tudo – mesmo sendo sob a objetiva do narrador, com suas perspectivas e preconceitos. Afinal, não há um narrador do 'ponto-de-vista divino', isto é, onisciente, onipresente. O narrador não sabe tudo sobre o protagonista, mas sabe o suficiente para deixar dúvidas e enigmas para torturar a curiosidade de cada leitor.

Enigmas que continuam. O que faz Gatsby? Qual a fonte de sua riqueza? Ele é contrabandista? Um mafioso? Nada é esclarecido. Enquanto isso os convidados zombam de sua farta hospitalidade. Aqueles que desfrutam de suas festas não hesitam em apontá-lo como espião ou contrabandista de bebidas. Dizem e acusam, ali no jardim, enquanto bebem e comem às suas custas! Um Gatsby que é tão misterioso - e também enérgico e impulsivo. Sempre em movimento, sempre se reafirmando.

Descobrimos, nós, os atentos leitores, que o protagonista é 'construído' ao longo da narrativa, em pequenos recortes, em algumas situações, jamais descrito completamente, mas gradativamente, peça por peça, assim como o Leopold Bloom de Ulisses (James Joyce) ou o Darell de The Razor's Edge (de Maugham) ou o Harry Haller de O Lobo da Estepe (de Hesse). Protagonista densos e que se desenvolvem durante a narrativa, sempre ao olhar de um outro (do narrador e de outros figurantes). Em alguns momentos, o que protagonista pensa de si mesmo, Gatsby por Gatsby, Gatsby na Guerra, Gatsby que deu a volta por cima. Mas a perspectiva ainda é de Gatsby pelo olhar de Nick, ou o protagonista na voz do narrador.

No mais, Gatsby está ciente dos boatos e estórias que circulam sobre a sua vida e sua riqueza. Que os convidados traficam impressões enquanto degustam os petiscos do banquete. Enquanto anfitrião ele sabe das mentiras e meias-verdades. E o que passa a ser curioso é o seguinte: por que Gatsby se aproxima de Nick? Por que ele é o primo de Daisy? Como Gatsby soubera? Como sabia sobre o vizinho? Ou ainda: por que narrador e protagonista se atraem? Afinal, o narrador Nick é bem crítico quanto às amizades de Gatsby e seu círculo de festivos. Quem seria um tal Wolfshiem, com jeito de mafioso? Um jogador trapaceiro? Ou ainda, o que Gatsby sente com relação a Tom Buchanan é só rivalidade? Ou também inferioridade? O que acontecera realmente entre Gatsby e Daisy alguns anos antes?

Enquanto as perguntas não são respondidas, o caso amoroso entre Nick e Jordan prossegue. Daí o narrador adentrar ainda mais o círculo de amizades do casal Daisy e Tom, e adentrar mais o labirinto das especulações. Por que o Sr. Gatsby é o protagonista? Por sua figura de romântico fora de época? E seu ar de galã ? Ou de homem que enriqueceu, um self-made man ? É quando reaparece a esportista Jordan Baker, a conceder algumas respostas. Sabemos mais sobre o romance entre Daisy e Jay Gatsby, a chegada da Guerra, a jornada militar de Gatsby, então, após o Armistício, o casamento de Daisy com Tom, devido às questões de classe, e o retorno do homem em busca de sua paixão do passado. Então é isso: uma história de amor. Tudo o que Gatsby faz é para atrair a atenção de Daisy! Ela que nunca aparecera sequer a uma das festanças!

Sabemos que a amizade de Gatsby por Nick é algo interesseira, uma vez que ele deseja é rever a querida Daisy. É por isso que Gatsby tem uma proposta para Nick, no propósito de ganhar mais dinheiro. Mas qual a fonte de renda do Sr. Gatsby? Finanças ou contrabando? Nick desconhece. Sabe que, segundo o dono, o novo rico trabalhou três anos para poder comprar a mansão das festanças. (Em dado momento, Gatsby se refere a um rendimento com drogarias e petróleo, mas nada mais é esclarecido. É comércio legalizado? Ele é acionista? É especulador?) Enquanto isso, Gatsby cuida da decoração da casa de Nick, pois espera que Daisy visite o primo, uma vez que foi convidada. Ela nem sabe o que a espera...


continua ...


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fonte: FITZGERALD, F. Scott. O Grande Gatsby. Trad. Roberto Muggiati. 5ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2012.



jul/ago/13

Leonardo de Magalhaens




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